Mais de 500 hepatectomias robóticas com menos de 1% de conversão para aberta

Mais de 500 hepatectomias robóticas com menos de 1% de conversão para aberta

Por: PUBLICADO EM: 05 dez 2023

O serviço de cirurgia oncológica do AdventHealth Tampa, no estado da Flórida, nos Estados Unidos, reúne uma das maiores expertises do mundo no uso de robô para operar pacientes com diagnóstico de câncer de fígado primário ou metastático. Desde 2016, a experiência acumulada é de 530 hepatectomias robóticas. O volume atual da instituição é de cerca de 150 hepatectomias anuais, sendo que 85% são cirurgias minimamente invasivas por via robótica. Outro dado do serviço aponta que em menos de 1% dos casos houve a necessidade de conversão para cirurgia aberta.

As informações foram trazidas pelo cirurgião oncológico indonésio Iswanto Sucandy, do AdventHealth Tampa, na Sessão de Fígado do XVI Congresso Brasileiro de Cirurgia Oncológica, organizado pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO). O evento aconteceu de 15 a 18 de novembro no Windsor Barra Hotel, no Rio de Janeiro.

Iswanto Sucandy, que também atua no treinamento de novos profissionais, habilitando-os para as diferentes modalidades de cirurgia minimamente invasiva, relatou, em entrevista para o site da SBCO, os principais avanços em cirurgia minimamente invasiva que resultam na baixa taxa de conversão, destacando os benefícios, desafios e impactos desta técnica, dentro de um contexto de cirurgia segura.

SBCO – O cirurgião oncológico está caminhando para a direção da cirurgia digital e da busca pelo entendimento, por exemplo, do perfil molecular dos tumores?

Iswanto Sucandy – Com o passar do tempo, o conceito de tratamento do câncer está caminhando para uma combinação de cirurgia digital minimamente invasiva com tratamento oncológico sistêmico. Muitas novas quimioterapias e imunoterapias são lançadas e são mais eficazes do que antes. Então, isso permite que um paciente irressecável seja ressecável e que este paciente ressecável, faça uma cirurgia menor.

Paralelamente, a cirurgia digital também está evoluindo rapidamente. Por quê? Porque a tecnologia agora está se tornando cada vez mais avançada, e prevejo que a cirurgia digital robótica se tornará um lugar comum, assim como aconteceu com a laparoscopia. Antes se dizia – meu Deus, a laparoscopia é cara -. Agora, não é. Então, acho que aconteceu a mesma coisa com a cirurgia robótica. Fui para a Austrália há cerca de três meses e existem 30 empresas de robótica. Tipo, oh meu Deus, 30. E o preço era apenas um quarto do preço de 50. Então, as coisas estão caminhando para se tornarem mais disponíveis para os pacientes. Veja bem, conversei com um colega aqui no Congresso. No Brasil, as pessoas têm que pagar cerca de US$ 2 mil a mais. Nos EUA, isso não ocorre. Lá, a seguradora paga por isso.

Concluindo, as coisas vão caminhar para uma cirurgia melhor. Uma cirurgia minimamente invasiva, mais precisa e guiada por imagem. O mais importante não é só a forma como você corta. A imagem é melhor. Isso lhe dá mais feedback. O cirurgião pode planejar melhor a execução da cirurgia. O desenvolvimento vai continuar. Este é apenas o começo.

SBCO – Qual é a importância da formação de profissionais em cirurgia robótica?

Iswanto Sucandy – A habitação em cirurgia robótica deveria começar com algum treinamento laparoscópico. O treinamento em cirurgia robótica leva algum tempo.  As pessoas não deveriam esperar que fosse como um macarrão instantâneo.

Neste campo, gostando ou não, há um rápido movimento em direção à cirurgia robótica, à cirurgia digital e isso será cada vez mais comum. Mas a formação tem que ser feita. Tem que ser criada de forma colaborativa com a sociedade. Eu, pessoalmente ministro, cursos de cirurgia robótica hepatobiliar em nossas instalações na Flórida. Temos cirurgiões do Catar, da Grécia e da Alemanha. Todos eles vêm ao centro para aprender. O cirurgião aprender sozinho não é seguro. Vemos o tempo todo o problema que advém do aprendizado inseguro da cirurgia robótica. Então, estamos tentando torná-lo o mais seguro e padronizado possível.

SBCO – Qual é o passo a passo para uma hepatectomia central?

Iswanto Sucandy – Eu dei uma palestra no primeiro dia sobre hepatectomia central e falei sobre o câncer de vesícula biliar porque é um dos cânceres do trato biliar mais comuns na América do Sul. Então, escolhi o tema porque a operação de hepatectomia central para câncer de vesícula biliar requer linfadenectomia portal. E a linfadenectomia portal é normalmente uma etapa difícil para os cirurgiões que a realizam por laparoscopia.

Por que é difícil? Por ser laparoscópica, a ressecção deve se ajustar ao ângulo das vasculaturas. Então, escolhi isso como um bom caso para robótica. A ressecção do fígado em si, é padrão. Quando começamos a fazer cirurgia minimamente invasiva, não fazemos muita ressecção central porque ela é complexa.

Mas agora, a ressecção central também é rotina para nós. Então, quando retiramos tumor no segmento 4A, 4B, por exemplo, muitas vezes poupamos o lado esquerdo do fígado. E fazemos o setor anterior direito, segmento 5 e 8, também com boa frequência.

SBCO – Como o sangramento é controlado na hepatectomia minimamente invasiva?

Iswanto Sucandy – O controle do sangramento é provavelmente a habilidade mais importante que o cirurgião deve ter. O sangramento menor pode ser feito com alguma pressão e uso de um agente hemostático. Esse não é o problema. O problema é quando não funciona. Quando você usa agente hemostático, você gasta energia e não funciona. Passa a haver necessidade de sutura, o que é um problema, pois suturar laparoscopicamente é até viável, mas às vezes não é muito fácil e, tampouco, versátil. E esse tipo de situação geralmente leva à conversão. Com o uso de sistema robótico, este é um problema menor. Mesmo quando há uma abertura grande na cava, conseguimos suturar com robótica sem muito suor.

 

Na cirurgia robótica do câncer de fígado há diferentes cenários?

Iswanto Sucandy – Existem muitos cenários. Porque, inicialmente, o paciente vem com um fígado diferente. Mesmo que o oncologista possa pensar que a cirurgia do câncer de fígado é a mesma coisa, na verdade não é. O fígado pode ter cirrose ou pode ser gorduroso, por exemplo. O tratamento depende da localização do tumor e muitos pacientes fazem uma ressecção repetida e isso significa que parte do fígado foi removida no passado e agora eles precisam de outro. Então, nessa situação, a operação é muito diferente da primeira operação. Estamos vendo estes cenários novos porque, em outras épocas, o paciente vivia pouco após a primeira cirurgia. Com os avanços da cirurgia, da quimioterapia e tudo mais, essas pessoas vivem mais. Por sua vez, a operação se torna cada vez mais difícil. E o paciente precisa de mais cirurgia preservadora do parênquima, muito mais agora do que antes.

 

SBCO – A conversão de minimamente para cirurgia aberta é baixa. Essa boa notícia também é válida considerando a metástase?

Iswanto Sucandy – Sim. A taxa de conversão, pelo menos em nossas mãos, é muito baixa. E isso vale para câncer primário de fígado e de intestino e para câncer de fígado metastático. Na verdade, o câncer de fígado metastático é mais fácil de tratar do que o primário. Sabe por quê? Porque para tumores colorretais ou neuroendócrinos metastáticos, por exemplo, o fígado está normal. O paciente não é cirrótico. Então, lidar com esse tipo de fígado é fácil. O câncer primário de fígado ou às vezes o colangiocarcinoma, é na verdade muito mais difícil, porque o parênquima hepático não é saudável.

Texto produzido por Moura Leite Netto

Buscar Especialista